segunda-feira, 28 de outubro de 2024

 

DOBRADURAS
As classes estavam dispostas em círculo, na turma B, da Quarta Série. A professora ensinou como fazer um cisne, com dobradura.
— O que era isso antes de fazer as dobras? — A professora perguntou.
 Papel — a maioria respondeu.
— O que ficou?
 Um cisne.
 Como conseguimos isso? 
 Dobrando.
 Primeiro transformamos num quadrado e depois?
 Dobramos e virou um triângulo, e depois um cisne. 
A professora pediu que comparassem a dobradura com a vida.
— Nós também nos transformamos — respondeu um menino.
— Quando a gente nasce não tem cabelo, nem dente, só chora — disse uma menina.
A professora concordou com as afirmações e comparou as transformações que passam os nossos corpos, assim como a folha.
Quase todos acompanhavam a atividade com muito interesse, menos uma menina: o olhar distante, enxergando longe ou olhando para dentro dela mesma.
A professora desmanchou a dobradura.
 O que ficou aqui?
 Voltou a ser papel  — muitos responderam.
A menina continuava do mesmo jeito.
Todos na escola conheciam a sua história. O pai estava envolvido com drogas e fora preso; a mãe, ela não conhecia; a madrasta, quando o pai foi preso, desapareceu também.
A professora chamou-a, abanando a folha que fora dobradura e tornara a ser folha novamente: 
— Marina, o que ficou aqui?
A menina permaneceu calada; o rosto contraiu-se um pouco. A professora insistiu na pergunta e ela respondeu, olhando pro papel:
— As marcas.
Terminou a aula.


Sérgio Vieira Brandão, nascido em Alvorada, RS, é escritor, professor, psicólogo e empresário. Mora em Tramandaí, RS (sergio.escritor@gmail.com).
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Conto publicado, em 2004, no livro ACONTECEU NA ESCOLAcoletânea de contos, Ísis Editora. 

 

PÉTALAS DISTANTES

 

Cabeça na terra, mas os pés no espaço
Às vezes amante da lua, outras vezes do
planetário
Buscando a saída pra dentro, por cansar de
fazer o contrário
Vivendo só por hoje o presente, sem ser
refém do futuro nem escravo do passado
Saboreando olhar nos olhos de uma
mulher linda, aproveitar cada minuto do
seu abraço
Levando pra casa na lembrança, o sorriso
encantador dessa doce Parvati dos
cabelos avoados
Linda Radha de olhar brilhante, suave
Shakti do beijo que umedece meus lábios
Tuas mãos se perdem em meus cabelos e
eu me acho em teus braços
Poesia em movimento, de um ônibus pro
outro, de parágrafo em parágrafo
Respeitando o seu tempo, aceitando o que
recebo do universo pelo espaço
Mudando a vibração do pensamento, vou
mudando também o que eu atraio...

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Poema PÉTALAS DISTANTES de Claudiomir CorrêaM.I.R. O artista mora em Alvorada, RS, é poeta, compositor, cantor e músico. 

   

Existem perguntas que todos nós sabemos responder com extrema subjetividade e com pouca definição, é o caso quando buscamos explicar o que são certos sentimentos.
Cartilhas individualistas com a receita da felicidade dizem que “devemos seguir nosso coração não importa o resto”, ou que “a felicidade está em sermos nós mesmos”. Mas o que realmente isso significa?
Apresento as quatro concepções históricas que construíram nossa ideia sobre o que é o amor:
Para Platão o mundo estava dividido em dois: o mundo perfeito das ideias e o mundo imperfeito da matéria. Este último seria uma projeção incompleta e falha do primeiro. O ser humano quando deseja algo, passa a amar o seu objeto de desejo, tão logo o tenha o sentimento se esvazia, a esse amor Platão chamou “Éros”, e seria uma visão materialista. Por tanto a elevação para um patamar superior corresponderia a amar o que estivesse mais próximo do mundo virtuoso das ideias, ou seja: valores como caráter e honra.
Aristóteles, seu discípulo, não viu as coisas assim. Este filósofo entendeu o universo como uma máquina perfeita e interligada por suas partes cada qual correspondendo a uma função que completaria a harmonia do cosmos. Todos nasceríamos com um propósito para cumprir. E o amor por tanto se manifesta quando conseguimos esse fim. Por tanto amar, seria o ato de se encontrar no mundo e este sentimento ao contrário do que disse Platão, só manifesta alegria.
Para o Cristianismo o amor era “Ágape”. A visão aristocrática grega entendia as pessoas divididas por classes, algumas superiores que teriam lugares importantes na harmonia cósmica, e outras com inteligência próxima ao mundo perfeito das ideias. Cristo com a máxima “ama ao próximo como ama a ti mesmo”, inaugurou uma nova visão não só religiosa, mas de concepção universalista do homem: todos eram filhos de Deus. Por tanto o amor Ágape cristão, é aquele dedicado a entrega ao outro em nome da relação. Como o amor de um pai por sua filha ou dos casais que constroem suas vidas apesar das imperfeições.
Por fim o amor é explicado pela sociologia. Platão escreveu sobre o desejo, mas não foi muito além. Existe desejo que entendemos como amor, mas da onde ele surge? Para a sociologia o desejo também é uma construção social do meio. Os padrões estéticos são estabelecidos por campanhas de marketing, o que é belo é construído por tendências de mercado, e isso abrange desde o vestuário a noção de beleza. Nós amamos uma imagem construída por nos mesmos de perfeição segundo um padrão anteriormente colocado.


Graduado em História, o escritor Everton Santos, autor do livro O SOL DOS MALDITOS, é coordenador dos eventos Feira Alternativa e Ensaio de Rua, músico da banda de punk rock Atari e apresentador do canal, no youtube, Consciência Histórica. Mora em Alvorada, RS.
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Crônica postada, em 21 de agosto de 2018, pelo autor, em sua página no facebook. 

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

 

Dizem que as crônicas são efêmeras e por isso um estilo de escrita quase inútil. rônicas falam de coisas presentes, do agora, são coisas de momentos e portanto passageiras.
Dizem que quando terminar uma crônica ela já será passado, mas tudo muda em segundos. E até mesmo a crônica da nossa vida precisa mudar para que surjam novas histórias e sempre haverá novos fatos a serem contados.
Crônicas são extremamente conectadas ao contexto em que são escritas por isso, com o passar do tempo perdem seu sentido. Crônicas são textos curtos, de vida curta, mas que são capazes de descrever a essência do momento em que é escrita.
Concordo que crônicas vivem apenas por instantes assim como as flores na primavera, mas nem por isso perdem seus encantos. As crônicas são sementes plantadas para o infinito assim como esta, que escrevo neste momento.
As crônicas podem até serem efêmeras, mas são testemunhas presentes nos fatos desde os mais simples até os mais complicados.
Mesmo que as crônicas sejam breves, elas merecem serem escritas.

A escritora Ironi Jaeger é coordenadora do Festival de Literatura e Artes Literárias (FLAL). Mora em Alvorada, RS.
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Crônica postada, em 04 de setembro de 2018, pela autora, em sua página no facebook. 

quinta-feira, 17 de outubro de 2024

  

 

Na playlist Joyce Alane,
na retina imagens fantasiadas
enquanto os dedos sangram poesia no teclado.
canção termina,
chá esfria e me lembra
que fragmentar-me em versos
é a forma de solidificar minha essência.

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Poema PLAYLIST E FRAGMENTOS do escritor Daniel Machado, Geógrafo da Alma! (Mora em Alvorada, RS).

  

QUANDO ENTENDI AS PALAVRAS

 

Muito cedo e rapidamente
me seduziu.
Eu era precoce em idade,
mas meus olhos brilhavam diante de ti
com uma volúpia que me furtava o ar.
De maneira “Quixoteana”
intentei combater castelos devastados pela perversidade,
cravar minha fúria em peitos “moinhos”,
reclamar o amor da minha Dulcinéia Del Toboso
E tudo porque passei a entender as palavras
e a elas ofertar o meu coração de poeta.

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Poema QUANDO ENTENDI AS PALAVRAS do escritor Daniel Machado, Geógrafo da Alma! (Mora em Alvorada, RS).

quarta-feira, 16 de outubro de 2024

 

FLAL: Mistura histórias de vida (da sua e de outras) com histórias imaginadas?

ANDERSON VICENTE: O escritor, por mais que escreva ficção (que é o meu caso) acaba trazendo a sua vivência nas obras que escreve. Os personagens são um exemplo disso. Os personagens que criamos não são uma extensão da vida do autor. Têm características próprias. São seres únicos. No entanto, quanto mais verdadeiros pareçam, mais aspectos da vida real eles têm.

FLAL: O que te levou a começar a escrever? Quando foi isso?

ANDERSON VICENTE: Escrevo desde garoto. Gostava de escrever histórias. Na adolescência, passei a escrever poemas. Na época, ainda não pensava em ser escritor. Somente aos 18 anos — a partir de uma oficina literária, ministrada pelo escritor Sérgio Vieira Brandão —, tive mais contato com o conto. Melhor dizendo, com a escrita do conto. Ali, cresceu meu interesse em escrever literatura.

FLAL: A música influencia você?

ANDERSON VICENTE: Depende. A vida influencia o autor. É no cotidiano que surgem ideias. E as ideias podem vir quando eu ouço uma música ou leio uma notícia no jornal. O escritor está sempre à procura de uma boa ideia. Uma boa música, seja erudita ou não, pode ajudar. As canções carregam consigo mensagens, força e sentimento. Embora, na maior parte do tempo, o escritor prefira o silêncio e a solidão para criar.

FLAL: Dizem que o sonho de todo escritor é publicar um livro físico com editora renomada. Você concorda? É seu sonho também? Já realizou? Acha importante para o curriculum de escritor?

ANDERSON VICENTE: Todo escritor almeja a leitura, do que escreveu, por outras pessoas. O livro continua sendo o maior sonho. Ter um livro físico publicado e lido por muitos leitores é uma grande conquista. Existem, no entanto, várias formas de publicações. Mas a tradicional, onde uma editora acredita e aposta em seu trabalho, creio que seja a maior busca. Escrever é uma constante. Tenho mais textos inéditos ou sendo escritos que publicados. Muitos estão na fila de espera de editoras. Ou foram recusados. Acredito, sim, que seja importante para o currículo.

FLAL: Estamos vivendo uma era tecnológica, livros estão sendo descartados, ler está quase supérfluo. Você apontaria algumas estratégias para que a leitura não ficasse tão aquém dessa realidade?

ANDERSON VICENTE: No mundo de hoje, a tecnologia está muito presente. Fica difícil imaginar a vida sem aparelhos celulares, aplicativos e redes sociais. A vida, também, parece estar mais corrida. Existe muito mais a sensação de falta de tempo do que há vinte anos. Estamos sempre correndo, apesar da tecnologia. E, isso, influencia na leitura. Para ler é preciso tempo. Mas o tempo está mesmo escasso? O dia ainda tem as mesmas vinte e quatro horas de décadas atrás. Embora sebos e livrarias tenham perdido espaço para lojas online, as vendas continuam. Leitores adquirem livros. O que, claro, devemos estimular é a leitura desde cedo. Começando em casa. Criar uma cultura de leitura e uma sociedade leitora é importante.

FLAL: O que o faz continuar escrevendo, se no nosso país, literatura estrangeira ocupa cada vez mais espaço, principalmente entre os jovens?

ANDERSON VICENTE: O escritor brasileiro escreve bem. Produz literatura de qualidade. O que nos falta é incentivo. Divulgação. Os livros estrangeiros costumam ter uma distribuição maior. As tiragens de um livro, aqui, não se comparam a determinados países de língua inglesa, como o EUA, por exemplo. Mas essa realidade não é apenas na literatura, ocorre, de forma em geral, com a produção cultural. Cultura, ainda é pouco valorizada no país. O espaço ao sol existe para poucos. Mas escrever faz parte da vida de qualquer escritor.

FLAL: Costuma ler seus livros depois de publicados? Se sim, sente-se feliz ou acha que poderia ter escolhido outras palavras, outros personagens...ter feito melhor?

ANDERSON VICENTE: Leio, sim. Geralmente, embarco na história. Gosto da leitura. Um texto, no entanto, pode ser escrito e reescrito indefinidamente. O escritor revisa e reescreve até o ponto em que a obra pode seguir adiante. Mesmo assim, após um tempo, em uma leitura mais acurada, sempre encontrará algo que poderia ser melhorado. Não na história, mas no texto. Uma vírgula que faltou. Ou, quem sabe, o olhar. Nosso olhar muda. Um texto, de certa forma, é produto de seu tempo. De quando foi escrito. E é preciso respeitá-lo.

FLAL: Qual o sentido de escrever nesses tempos robóticos? Acredito que seja mais desafiador.

ANDERSON VICENTE: Exige autodisciplina. Escrever no computador é um desafio enorme. Basta um clique no mouse para perder o foco. As facilidades que a tecnologia e a Internet nos trazem, também aumentam o desafio na hora de criar. É preciso saber equilibrar. Muitas vezes, escrevo um esboço no papel, antes de digitar no teclado. Evito ligar o celular. Claro, hoje, textos e ilustrações podem ser criados com Inteligência Artificial, mas não creio que o protagonismo do escritor ou do ilustrador possa ser substituído.

FLAL: Quais histórias ainda estão engavetadas? Pretende publicar?

ANDERSON VICENTE: Tenho vários manuscritos. Poemas, contos, crônicas e novelas. Uns terminados, outros por finalizar. Pastas com folhas avulsas, de textos que escrevi. Muita coisa no computador: projetos que pretendo continuar escrevendo. Livros para o público infantil. E alguns, já prontos, em busca de editoras para publicá-los.

FLAL: É possível viver da literatura? Dá para pagar as contas?

ANDERSON VICENTE: É possível. Conheço escritores que conseguiram essa façanha. Mas não foi de uma hora para outra. Geralmente, levaram um longo tempo até chegarem nesse patamar.


Anderson Vicente é escritor, gestor ambiental e formando em História. Reside em Alvorada, RS. Foi um dos fundadores do Clube dos Escritores de Alvorada — CEA. Participou de diversas coletâneas, escrevendo contos, crônicas e poemas. É autor dos livros juvenis Às voltas com a caveira e Na trilha dos zumbis.
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Entrevista para o Festival de Literatura e Artes Literárias, FLAL, postada na página do facebook, em 15 de outubro, e perguntas dos internautas ao autor.