quarta-feira, 23 de julho de 2025

 

Tive uma vida normal com mulher e filhos, trabalho no escritório de contabilidade, alcoolismo e separação. Na tarde que recebi o telefonema que confirmou a morte da minha velha mãe eu passei mal. Senti ânsia de vômito e precisei de água, ar e uma dose de bebida. Ela já estava muito debilitada pelo Alzheimer, situação que veio se agravando após a morte do meu pai. O pior de tudo é que eu teria que voltar na vila para resolver problemas legais e também da condição do meu antigo lar. isso não era nada agradável, aquele lugar estava morto para mim, voltar lá significava desenterrar um cadáver. A viagem foi tranquila, apreciei as paisagens bucólicas da janela do ônibus. Quando eu era criança adorava viajar de ônibus com meu pai para a cidade. Percebi que naquela situação, vendo antigas paisagens, estava me despertando sentimentos de nostalgia que não eram exatamente bons. 
O enterro foi rápido e solene, havia um número considerável de pessoas, como a vila não tinha cemitério a cerimônia foi feita na comunidade vizinha. Após uma viagem curta, ao chegar na casa da minha falecida mãe tudo estava quase igual eu havia deixado há 20 anos. A não ser pelos evidentes sinais do tempo. O jardim do meu pai e os alfaces não existiam mais, a pintura da casa estava pior do que eu jamais havia visto. Tudo ali lembrava abandono e solidão, como se a velha casa cansada das suas próprias memórias, estivesse pronta para se fechar e repousar em uma introspecção que levava o peso das gerações passadas. Ninguém vai morar ali agora, eu fui embora e não iria voltar. A casa dos meus pais poderia descansar. 

(Parte V)

Além de tudo que eu revi, reparei que a figueira ainda estava exatamente como eu me lembrava. O tempo não parecia ter lhe afetado em nada, seus galhos, as folhas, o tronco e as grandes raízes onde eu me deitava quando garoto, estavam plenas e vigorosas figurando na visão que precedia o campo e que levava até a floresta. Essa sim parecia diferente.

Depois de todo aquele tempo eu tive impressão que ela havia crescido, algo estranho, dada a tendência contrária das atividades humanas diminuírem o tamanho desses lugares. Acendi um cigarro e fiquei admirando a vista da varanda sentado na cadeira da minha mãe, encarei a floresta dizendo para mim mesmo que nunca mais iria voltar. Quando enchi os pulmões com a segunda tragada acabei fixando a visão ainda mais naquele horizonte, eu sempre imaginei o que haveria no interior da floresta. Foi então que o improvável aconteceu: uma pessoa adentrou na mata. Pude ver nitidamente de onde eu estava, apesar da distância. Com um pouco de hesitação decidi verificar o que estava acontecendo, era uma situação interessante. Eu me senti um personagem idiota de filmes de terror, que ao invés de chamar a polícia, coloca-se em perigo. Porém, havia em mim a vontade de explorar o lugar, de saber o que havia por lá, de olhar tudo e ter as certeza que não havia nada. Mas e aquela pessoa? Por que entrou em uma floresta escura durante a hora do crepúsculo? Seria um assassino que vai finalizar sua vítima? Um homem que se transforma em uma besta quando o sol se põe? Ou apenas jovens indo ter relações sexuais ou usar drogas? Eu quis rir das minhas hipóteses, mas meus lábios não obedeceram, parecia que a situação me impelia para uma certa seriedade. Andando com passo apressado atravessei o campo. Sempre cuidando ao meu redor, a floresta estava ainda iluminada por poucos raios de sol antes do anoitecer, e me pareceu bem mais intimidadora do que no meu sonho. De fato havia uma trilha para o seu interior, mas era bem mais larga que eu imaginei, e a débil luz do sol ainda lhe cobria o caminho por uma boa parte. As sombras da escuridão se erguendo vagarosamente na projeção das árvores e arbustos dava um ar fantasmagórico para o local, e eu realmente achei uma bela visão: era como um túnel de sombras feito por árvores sinistras que se inclinavam.

CONTINUA...

Graduado em História, o escritor Everton Santos, autor do livro O SOL DOS MALDITOS, é coordenador dos eventos Feira Alternativa e Ensaio de Rua, músico da banda de punk rock Atari e apresentador do canal, no youtube, Consciência Histórica. Mora em Alvorada, RS.

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Romance postado, em 25 de março de 2025, pelo autor, em seu blogue O Sol dos Malditos Underground
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Clique aqui e leia o romance na íntegra.

sexta-feira, 18 de julho de 2025

 

 DOSE PARA A VIDA


Uma dose de confiança e esperança.
Uma dose de autoestima.
Uma dose de capricho.
Uma dose de alegria e amor.
Uma dose de luz para você.
E, para todos os momentos, uma dose exagerada de Deus.

Desejo a você muito axé!

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Poema DOSE PARA A VIDA, da escritora Simone Soares. Educadora popular e embaixadora da Editora Plena Voz, a autora reside em Alvorada, RS, e, desde 2024, organiza, junto com artistas, apoiadores e escritores, a Feira Literária Independente em Alvorada.
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UM ESCRITOR DE MUITAS FACETAS
(Anderson Vicente)

Quem de nós, em algum momento, não ficou impressionado com uma história contada por alguém? Tão impressionado que exclamou algo como: “Uau; podia virar um livro!” Já no século XIX, Hans Christian Andersen e os irmãos Grimm, Jacob e Wilhelm, percebiam a importância desse tipo de história. Do mesmo modo, muitos séculos antes, as histórias de As Mil e Uma Noites migravam das histórias orais para a escrita. O cordel, outro grande e antigo representante da tradição popular, nos revela isso. Difícil não ficarmos maravilhados com os versos dos livretos. Mas hoje, neste tempo de mil e um aplicativos, existem histórias orais? Histórias que possam ser transformadas em literatura?
Digo que, para responder a tais questões, é preciso conhecer o autor. São poucos os que sabem o verdadeiro nome dele. Ele é um escritor com muitas facetas. Ou melhor, com diferentes pseudônimos. Nesta obra, em particular, ele adotou Crisóstomo como pseudônimo e personagem. Crisóstomo narra em primeira pessoa. Vive a história de um motorista de aplicativo. E, assim, o personagem vive o dia a dia do próprio autor. Ficção e realidade compõem um elaborado e interessante mosaico. Opa! Não posso entregar o jogo! Crisóstomo jamais me perdoaria. Mesmo que eu não revele, o título é um alcaguete. Nele, está revelado que, aqui, neste livro há uma bruxa.
A Bruxa da Bom Jesus é um texto empolgante. De tirar o fôlego, de ler em um só fôlego (não de modo literal, é claro). Não dá vontade de parar a leitura. Fica difícil não dar spoiler. Preciso ser forte. Bom, não devia, mas... Preciso dizer que, no livro, existem bônus. Crisóstomo é um contador de histórias e tanto. Ali, no livro, de repente, surgem o Boca Braba, o Dexter e o Salomau vindos da cabeça e, de outras obras, do autor. Todos eles são personagens e pseudônimos. Eis um livro fascinante! Cheio de expressões, de gírias, de frases de autoconhecimento, de provérbios. Tem até teste vocacional para motoristas de aplicativo!
A bruxa está à solta nas páginas. Um Lobisomem circula pelos arredores. Há um isolado leprosário. E, ainda, existe um terrível manual que afasta alguém que queremos em sete dias. Sete é um número misterioso. Cheio de significados. Em um mundo repleto de perigos, por que não blindar um Uber? O risco pode vir, de forma inesperada, de uma amizade. Então, julgo que foi uma grande leitura. E, o autor me surpreendeu, mais uma vez. Criatividade, imaginação, enredo. A experiência de quem presencia fatos e sabe escutar. Adora ouvir as pessoas e as histórias dos passageiros. Um escritor que dá um toque único. Que lapida uma tradição oral. A tradição dos contadores de histórias.  

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Anderson Vicente é escritor, gestor ambiental e formando em História. Reside em Alvorada, RS, onde ajudou a fundar o Clube dos Escritores de Alvorada (CEA). Tem diversas participações em coletâneas de contos, crônicas e poemas. É autor dos livros juvenis Às voltas com a caveira Na trilha dos zumbis.

N.E. Um Escritor de Muitas Facetas é o título do prefácio escrito por Anderson Vicente para o livro, do escritor Deodato JúniorA Bruxa da Bom Jesus: Histórias que até Zeus duvida (coletânea de contos, Editora Meia-noite, 2025).

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VIDA 

(Verão - Parte III)

Ah. Pode ser.
 Para. Você quer ou não?
 Eu quero. Calma.
 Então daqui um ano a gente se encontra.
— Tudo bem.
 Promete?
 Precisa tudo isso? Que exagero.
 Como você é chato.
 Só porque você vai embora amanhã e vai esquecer isso daqui uma semana, prometo.
Demoraram a chegar à casa em que estava hospedada com os pais. Queria estar com ele, beijá-lo mais algumas vezes, sentia aquele calor que nem o vento frio diminuía. Se o rapaz gostava dela da mesma forma, nunca transparecia. Ficaram à porta, a madrugada dando lugar ao nascer do sol. Seu pai ficaria furioso, mas não importava. O verão estava acabando. Era só isso. Uma memória que desapareceria dando lugar a novas lembranças.

 (Continua...)


Ben Schaeffer é escritor, advogado e contador. Natural de Porto Alegre, reside em Alvorada, RS. Ávido leitor, lê vários gêneros, desde livros de ficção científica, de fantasia e de mistério até histórias em quadrinhos. É autor do livro Dan Plaggo Porto das Bruxas e da série Histórias do Reino de Puphantia (O Grande Assalto e Os Fantasmas de Puphantus).  
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Conto, do autor, VIDA.
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VIDA 

(Verão - Parte II)

Acho que sim.   Não há sinal de tristeza naquele rosto.
Tá bem então. É isso.
Porque a gente não aproveita o hoje? É o que você tem.
Vou descer.
Espera. Não faz assim.
Tá tudo bem, é isso. Está tarde.
Enquanto caminha pelo gramado do morro vê ao longe uma pequena capela. Ouve o som dos passos dele, que a alcança e entrelaça seus dedos nos dela.
Se você ficar brava, fica mais fácil de ir embora amanhã.
Você é um idiota.
Ele ri e aponta para a capela.
Existe há muito tempo, sabia?
É? Quanto tempo?
Mais do que a soma das nossas idades.
Uau.
Vai rindo. Uma hora vamos ter o dobro da nossa idade e vamos ser velhos.
O que acha de nos encontrarmos em frente a capela?
Quando? Amanhã?
Eu vou embora amanhã. Tô dizendo daqui algum tempo. Sei lá.

 (Continua...)


Ben Schaeffer é escritor, advogado e contador. Natural de Porto Alegre, reside em Alvorada, RS. Ávido leitor, lê vários gêneros, desde livros de ficção científica, de fantasia e de mistério até histórias em quadrinhos. É autor do livro Dan Plaggo Porto das Bruxas e da série Histórias do Reino de Puphantia (O Grande Assalto e Os Fantasmas de Puphantus).  
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Conto, do autor, VIDA.
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sexta-feira, 11 de julho de 2025

 

A MINHA IMAGINAÇÃO


Não sou Mário Quintana,
nem sei escrever tão bem.
Quem sabe um dia desse,
Serei uma poetisa também. 

Quando estou escrevendo
esqueço até mesmo de mim.
Eu me vejo flutuando,
por esse mundo sem fim.

No paraíso da imaginação,
não tem tristeza e nem dor.
Todos vivem com alegria,
Com carinho e muito amor.

Um dia será real,
essa minha imaginação.
Todos terão saúde,
Muita paz no coração.

Obrigada meu Criador,
Por mais esse dia.
Sou uma privilegiada,
por que tenho minha família.

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Poema A MINHA IMAGINAÇÃO, da escritora Maria Rosa. Natural de Santo Antonio da Patrulha, a autora, reside em Alvorada, RS. Participou das coletâneas Livro do Trabalhador; Pérolas Ocultas; Somos Alvorada e; Raízes. Atualmente, está escrevendo um livro de poesia. 
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Escrito, pela autora, em 23 de março de 2020.
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A VIDA EM CICLOS


Em ciclos de vida, o tempo tece, Primavera, infância, em flor renasce. Despertar da alma, verde a brotar, Alegria pura, sem fim, a bailar. Verão, juventude, sol a brilhar, Paixões acesas, sem medo de amar. Dias longos, sonhos a voar, Amores quentes, para sempre guardar. Outono chega, a maturidade a colher, Folhas douradas, sabedoria a crescer. Calma e reflexão, um tempo de pensar, Memórias guardadas, para sempre lembrar. Inverno, velhice, o fim a abraçar, Neve que cai, um ciclo a findar. Em paz e silêncio, a alma repousar, No frio que acalma, a vida a cessar.

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Poema A VIDA EM CICLOS, da escritora Ironi JaegerCoordenadora do Festival de Literatura e Artes LiteráriasFLAL, a autora reside em Alvorada, RS.
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Escrito, pela autora, em 23 de Junho de 2025.
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SÃO PEDRO ENCERRA O MÊS DOS FOLIÕES

Na despedida do mês mais gaiteiro do meu país, São Pedro, considerado o guardião das chaves do céu, apadrinha 16 concelhos. Em honra do pescador que preteriu a pesca de peixe pela pesca de homens, as populações piscatórias organizam uma procissão cujos andores são carregados pelos homens do mar. É um santo popular, especialmente venerado pela população piscatória, viúvos e viúvas. A população decora as ruas com manjericos, bandeiras coloridas, balões e arcos de flores. Em algumas regiões, como Póvoa de Varzim, é comum ver as varandas das casas decoradas com colchas e panos bordados. Alinhado com os dois antecessores, e usufruindo do calor, a noitada é de farra com muita comida, bebida e bailaricos.
Três festividades religiosas que se tocam na celebração duma homilia enriquecida por grupos, corais e bandas musicais e, na confraternização da família em volta duma mesa aprontada com a melhor louça e talheres, para apreciar o cabrito ou borrego assado no forno e a doçaria regional.
Curiosidades e Lendas:
Simão (o pescador) era pescador, trabalhava no Mar da Galileia com seu irmão André. Acederam ao chamamento de Jesus para segui-lo e se tornaram dois dos seus doze apóstolos. Jesus mudou o nome de Simão para Pedro, que significa "pedra" ou "rocha", para indicar o papel fundamental que ele teria na construção da Igreja.
Pedro (o apóstolo) foi o melhor amigo de Jesus e tornou-se um apóstolo durante seu ministério. Após a sua morte, tornou-se líder dos apóstolos, sendo, frequentemente, descrito como seu porta-voz nos evangelhos.
Papa a Igreja Católica considera São Pedro o primeiro Papa, baseado em passagens bíblicas e na tradição;
Martírio a tradição cristã relata que São Pedro foi crucificado de cabeça para baixo em Roma, por se considerar indigno de morrer da mesma forma que Jesus, no dia 29 de junho;
Basílica de São Pedro  na Cidade do Vaticano é dedicada exclusivamente ao martírio do Santo.
Chaves do Céu reza a lenda que as chaves do céu e do inferno, foram-lhe entregues por Jesus Cristo depois de ter sido feito o líder da sua nova igreja.
A perpetuação dos costumes — saltar a fogueira, lançar balões de papel, bater na cabeça com alho-porro ou martelos de plástico e manjerico encorajam um povo entristecido por um inverno cinzento e uma primavera rejuvenescedora para o início da estação das colheitas.
Adeus ao mês batizado com o nome da mulher do deus romano Júpiter, Juno.
Alexandra Ferreira é autora de Sombras com Rosto (romance, 2019) e de Um Verão Sem Ti (antologia de contos, 2023). Portuguesa, natural de Viseu, reside no Porto. É engenheira civil, pós-graduada em Direção de Empresas e mestre em Engenharia Rodoviária. Integrante do Festival de Literatura e Artes Literárias (FLAL) e do canal Liga dos 7, no facebook. Escreve para revistas literárias e clubes de leitura. Participa, ativamente, de congressos, sendo coautora de diversos artigos científicos.
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Crônica postada, em 01 de julho de 2025, pela autora, no canal Liga dos 7, no Facebook.
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A BRUXA DA BOM JESUS (Parte III)

Na manhã seguinte, enquanto os gerentes rendiam a equipe da noite, dois adolescentes se esgueiravam lomba acima.
Ao chegarem em frente ao chalé vermelho, um gato preto, veio miando em tom de intensa reprovação. Porém, eles não deram a mínima. Tudo o que eles precisavam era de uma evidência para apresentar ao santo ofício e queimar a pobre mulher em uma fogueira santa.
ressaltando que estamos falando dos anos oitenta. Hoje, a Bonja é uma comunidade extremamente pacífica.
Agora, vem comigo e observe uma figura esguia e mais torta que um pé de goiabeira, vindo até o portão de estaqueta, para atender os especulas.
Ao encostar a verruga peluda sobre a ponta da haste, seus olhos cintilavam de ódio e sua voz denotava que ela não cairia no álibi dos butiás.
 Sumam daqui, seus pestinhas! Não tem gelo, nem butiá, pra vocês. Desapareçam e nunca mais, passem em frente à minha casa.
Não foi preciso repetir. Ao ver sua cabeça toda enfaixada com uma velha meia-calça marrom e uma protuberância bem no meio da testa, o galo da consciência cantou e, em dois palitos, o casal de primos estava chegando em casa, para confirmar as suspeitas de todos.
 A velha é bruxa, a velha é bruxa é a bruxa da Bom Jesus! Disseram em coro, os dois mosqueteiros do Sítio do Pica-pau amarelo.
Ao ouvir tais ilações, Claudionara subiu o morro na força do ódio e foi dar o papo reto para a suspeita, que já estava quase pisando no cadafalso, sem direito a defesa.
Enquanto marchava como uma vaca braba, pensava alto e disparava impropérios para aquecer a língua e destruir verbalmente sua vizinha.
Acho que nem é preciso dizer que ela chegou mais rápido que a conta de luz. Ao avistar um vestido preto cruzar lentamente pela porta do barracão colorado, imediatamente, nossa sargentona bradou em alto e bom som, chamando a misteriosa mulher para a conversa.
 Dona Amália, venha cá! Vamos trocar uma ideia. É o seguinte: na noite passada, uma borboleta gigantesca invadiu nossa casa e repelimos a miserável à vassourada. Porém, da próxima vez, vamos queimar a bruxa no fogão à lenha. A senhora entendeu bem, dona Amália?
— Sim, sim. Entendi perfeitamente. Disse a pobre velha, com muito medo no olhar e um aperto no peito já arqueado pelas inúmeras luas e os perrengues típicos de uma favela.
no apagar das luzes da corrida, Cláudia me contou que, alguns meses depois deste caloroso encontro, dona Amália desencarnou, devido a um tumor no cérebro. Dizem as más línguas que, a causa mortis foi consequência das pancadas recebidas na cabeça, por um piá que só queria defender sua irmãzinha de uma bruxa malvada.
Finalizando, sobre a menina que já estava quase indo de arrasta, Claudia me informou que Joaninha se recuperou, cresceu como um pé de palmito e hoje é adulta, com sete filhas mulheres. Detalhe: a primogênita, mesmo sem entender a metade da missa, teve que batizar a caçula.

 (Continua...)

Natural de Alvorada, RS, Deodato Júnior é motorista de aplicativo e palestrante. Criativo e versátil, o autor costuma criar diferentes pseudônimos para suas obras. São os casos de Salomaucriado para os livros O Lobisomem do LeprosárioProvérbios de Salomau e Teste Vocacional para Motoristas de Aplicativo e; de Crisóstomo, na obra A Bruxa da Bom Jesus: Histórias que até Zeus duvida.
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Conto publicado no livro A Bruxa da Bom Jesus: Histórias que até Zeus duvida (coletânea de contos, Editora Meia-noite, 2025).
*CLIQUE NAS PALAVRAS COLORIDAS (BIOGRAFIA).