(Parte V)
A floresta misteriosa e a sua trilha finalmente seriam desvendadas por mim. Provavelmente, e com sorte, acharia um tenebroso e majestoso pântano, quem sabe antigas árvores, tão velhas quando a figueira. Mas não foi bem isso que aconteceu. A trilha era muito maior do que eu pensava, e caminhando cada vez mais por ela, a floresta foi me oprimindo, fechando-se no meu entorno, por entre os seus galhos e troncos, cipós emaranhados e plantas solenes, cada vez mais sentia que estava indo longe de mais. Dentro da escuridão da floresta o caos da natureza manifesta a sua potencia criadora e destruidora, a fome de vida e morte que move o rumo das criaturas pulsa no seio da floresta negra, eu desafiava o meu medo porque a atração pelo desconhecido era maior, o cortejo da velha figueira que me chamava para as profundezas que eu me dirigia, finalmente estava sendo correspondido. E eu não conseguia parar. Não me atrevia a olhar para os lados, para o interior da floresta. Um medo estúpido das formas espectrais e sombrias formadas pelo manto da noite que ia se estendendo corria-me na espinha, e eu simplesmente andava. A lua já podia ser vista por entre os galhos, lembrando que já devia ser tarde. Aquela aventura sinistra parecia não ter fim, mas foi após um leve declive que depois se tornou uma grande abertura, que novamente o improvável aconteceu: havia uma construção rústica no meio da clareira, e logo mais a diante começava o pântano. Então realmente havia um pântano, mas não dei muita atenção. A outra visão era muito mais interessante.
Ao que parecia era um altar religioso com um tipo de tigela de argila no centro, certamente utilizado para oferendas para algum deus pagão, talvez feito por indígenas ou escravos que passaram por ali em um passado remoto. No entanto havia algo curioso, pois não enxerguei nenhuma imagem ou inscrição. Apenas uma grande pedra no centro, onde deveriam estar essas coisas. Mas o que isso significava? Os antigos cultuavam pedras? No entorno do estranho altar o lodo negro e viscoso do pântano se espalhava, dando àquele lugar um aspecto profano. A pedra, que deveria ter um metro de diâmetro, era negra, mas tinha um brilho opaco que refletia a luz da lua. Como não havia outras pedras por ali, e o terreno era lamacento, conclui que ela não deveria ser originária do local. Alguém deveria ter a trazido para fazer o culto. Mas porque alguém traria uma pedra daquelas para o meio de uma floresta? E aquela trilha, por que ainda estava aberta? Estaria o culto aos deus pagão ainda sendo praticado? Eu duvidei disso, pois a comunidade da vila era católica, mas não consegui pensar em respostas plausíveis. Algo me ocorreu: e se a pedra negra tivesse caído do céu?
(Parte VI)
Quando eu voltei para a casa dos meus país, fiquei novamente sentado na cadeira da varanda refletindo. No final das contas, não descobri quem ou por que alguém entrou na floresta, e a visão do altar profano e da pedra negra me deixaram pensando em sacrifícios macabros e rezas satânicas, em fantasmas e monstros inomináveis. A pedra poderia ser um meteoro, e o início da trilha pode ter sido aberto pela sua queda, o declive e a clareira eram na verdade a cratera que foi gerada pelo impacto. Isso justificaria a sua presença inusitada e um altar em seu entorno. Os antigos, sendo supersticiosos e ignorantes, devem ter a visto encandeceste caindo do céu, assim lhe atribuíram divindade. Essas hipóteses foram criando vida na minha mente, e quando eu estava me preparando para entrar, vi, perto da figueira, algo curioso: era outro boneco de pano, fui pegá-lo. Representava então uma pessoa adulta, pois usava terno. Tive que passar mais tempo na casa. Os meus tios, que iriam assumir a administração do lugar antes da venda, estavam a caminho pra acertar as coisas.
Então resignado eu decidi comer alguma coisa e depois apenas esperar. Deixei o meu novo boneco de pano em cima da cadeira do meu pai, e decidi ir para o único estabelecimento da vila que vendia comida. O que eu não queria era ter que cumprimentar um por um dos vizinhos e ouvir os mesmos comentários de sempre, dessa forma peguei um caminho alternativo à rua principal, na verdade a vila só tinha uma rua. Andando e pensando sem parar na pedra negra avistei, infelizmente, um morador que eu conhecia. Era o velho Martin Rosenberg, estava parado sorrindo do lado de dentro do seu terreno, parecia muito mais velho que da última vez que o vi, na verdade estava com a idade tão avançada que o seu corpo magro parecia que iria quebrar. Eu o saudei, e sem me retribuir ele falou comigo com uma voz grave e rouca:
— Melhor ficar longe da floresta, lá é um lugar ruim...
— Melhor ficar longe da floresta, lá é um lugar ruim...
CONTINUA...
_________________________Graduado em História, o escritor Everton Santos, autor do livro O SOL DOS MALDITOS, é coordenador dos eventos Feira Alternativa e Ensaio de Rua, músico da banda de punk rock Atari e apresentador do canal, no youtube, Consciência Histórica. Mora em Alvorada, RS.
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Anderson
ResponderExcluirMuito bem escrito. Consegui percorrer a floresta e sentir os medos e as expectativas. 👏👏👏Alexandra Ferreira
Everton, o corretor automático alterou e não me apercebi. AF
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