Ele notou que ela analisava e observava todos os detalhes do seu corpo, cabelos e rosto. Victor possuía um rosto bem definido, com maxilares marcantes que dão a ele uma aparência atraente como os deuses gregos dos quadros que ela admirava.
domingo, 6 de abril de 2025
Ele notou que ela analisava e observava todos os detalhes do seu corpo, cabelos e rosto. Victor possuía um rosto bem definido, com maxilares marcantes que dão a ele uma aparência atraente como os deuses gregos dos quadros que ela admirava.
sábado, 5 de abril de 2025
RECADO PARA A SEMANA
Bem-vindo,
Bem-vivido,
Bem-aventurado,
Bem-recheado.
Que não nos faltem sorrisos,
Lutas e determinação para alcançar nossos objetivos.
Que não nos faltem sonhos,
Amor e fé para compartilhar.
O percurso ocorre ao longo do tempo,
A cada segundo, a cada minuto, a cada hora,
Que nos ensina.
Viva o hoje, viva o momento,
E viva a vida.
TESOURA (Parte I)
Vai para a frente da casa, onde sua cadeira está ocupada pelo gato. Ele nunca deu nome ao gato cinzento, às vezes acha que o animal sempre esteve por ali, mas é porque sua memória já não é mais tão boa. Ele ergue o animal até a altura de seus olhos, que o encara preguiçosamente, sem se opor. Depois o coloca no chão com delicadeza. O bichano se deita ao lado da cadeira, onde colocou um tapete. Senta-se na cadeira, observa a chuva caindo no pátio que precisa ser mais bem cuidado. Ao lado, à esquerda, sua plantação de milho. Teve que pedir que o ajudassem. Não tinha forças, a dor no quadril, a coluna reclamando. Era isso ou nada. Optou pelo pedido, pagou o serviço, teria que pagar para que colhessem. Voltou à cozinha, aqueceu a água em uma chaleira velha, fez um chimarrão, voltou à cadeira. Antes disso, pegou um petisco e deu ao gato. Ficou parado na porta enquanto via o bichinho comendo com voracidade. Será que é velho como eu esse gato? Tinha ouvido alguém dizer que esses animais podiam viver anos e anos. Talvez seja então, porque não me lembro de quando ele veio pra cá... Deve ser.
Sentou-se, encheu a cuia com água quente, as bolhas subindo enquanto fazia isso, a erva de desmanchando do monte, mas apenas o necessário, sugou o sabor amargo do mate, o som da chuva continuou. Plic, plic, plic caindo pela calha em um balde com uma arvorezinha. Sozinho ali, observando a chuva, a estrada, o campo a sua frente. De tempos em tempos um carro passava na estrada de terra cheia de buracos. Era uma linha reta ali, mas os buracos faziam os motoristas fazerem curvas, tentando evita-los, sem muito sucesso. Ficou ali, sentado, as canelas brancas e magras a vista, a calça era a curta, não tinha outra. Não se importava muito com isso. Àquela altura da vida não se importava com muita coisa. Talvez com a dor no quadril, mas melhorava, só precisava se mexer. Encheu outra cuia, ficou segurando-a sem beber.
Atravessando a estrada com um casaco sobre a cabeça, vinha uma vizinha. Passou por todas as poças com pequenos pulos, passou pelo portão que era preso por um pedado de corda e depois veio até a entrada da casa. Era jovem, já a vira algumas vezes nos últimos dias, mas nunca tinha falado com ela.
— Oi!
— Oi. — A voz rouca de quem pouco a usa.
— O pai pediu pra perguntar pro senhor se tem uma tesoura de poda.
Levantou-se sem dizer nada. Foi aos fundos da casa, deixando a menina na entrada. Ficou ali por um tempo, procurando, procurando. Encontrou em uma das caixas mais ao fundo, junto com algumas roupas que ele não conseguiu doar ou jogar fora. Tinha um vestido branco, cheio de grinaldas. Olhou, ficou ali parado, tesoura na mão.
— Moço?
Parecia tão longe, já não ouvia bem, mas a voz se aproximou e ele voltou ao presente. Olhou cansado para trás, a menina tinha vindo atrás dele. Devia ter uns quinze anos, tinha os olhos muito escuros que faziam um contraste interessante com os cabelos louros que guarneciam sem rosto redondo.
— Achei a tesoura. — Disse entregando o objeto.
O POETA ADORMECIDO
Dorme o poeta, sereno e calmo,
Sobre as plumas do esquecimento,
Enquanto o vento sopra em seu salmo
Versos de um último pensamento.
No leito de sombras, o sonho vem,
Lúcido véu entre mundos velados,
Vê-se além, além de quem,
Caminha em ecos, passos calados.
A morte lhe fala, doce, gentil,
Como quem canta um canto antigo,
Sem foice ou dor, sem ser hostil,
Apenas um toque, um afago amigo.
E ele sorri, ao se ver partindo,
Num barco de névoa, flutuando leve.
Morre dormindo, mas segue indo,
Vivo no sonho que nunca se atreve.
Mas outros dizem: "Ele se foi!"
Não sabem que agora é luz errante,
Que em cada estrela, em cada "depois",
Seu verso vive, eterno e vibrante.
A FLORESTA DOS MORTOS (Parte I)
Tudo começou com a morte do meu velho pai quando eu ainda era criança. Fiquei muito triste, como não poderia deixar de ser, mas minha querida mãe na época entrou em depressão profunda, apesar de não aceitar. Meu pai era um homem tranquilo e gentil, lembro dele com a sua marreta quebrando algumas pedras que atrapalhavam o seu belo jardim e plantação de alfaces nos fundos da nossa casa. Ele trabalhava na lavoura em terras arrendadas, era forte e eu o admirava, quando ficou doente nada restou do homem que um dia fez um jardim e quebrava pedras. Minha mãe, após o sepultamento, começou a apresentar comportamento errático e falho, taciturno e, por fim, totalmente apático. Sentava-se na sua cadeira na varanda, ao lado da cadeira vazia do meu pai, e ficava horas olhando para uma grande figueira ao lado da casa, e às vezes para a floresta que ficava mais além de um campo no final da nossa rua. Depois de algum tempo ela simplesmente começou a dizer que as coisas iriam melhorar. O local onde morávamos era uma vila agrícola que abastecia as cidades vizinhas, chama-se Vila do Sacramento, mas todos apenas chamavam simplesmente de vila, como se o lugar por não ser grande o suficiente não merecesse um nome. Havia poucas famílias, diziam que eram os descendentes dos moradores que vieram ocupar o lugar no início do século passado. Certamente os meus familiares de gerações passadas estiveram por ali, derrubando árvores, cortando mato e fazendo suas moradias. A nossa casa tinha pertencido ao meu avô, o pai da minha mãe, era de madeira gasta pelo tempo, e a pintura branca estava sempre descascando, ficava no final da rua onde estava a maldita figueira.
(Continua...)
terça-feira, 25 de março de 2025
O hábito de anotar se tornara tão constante que desenvolvi um calo entre o dedo indicador e médio devido ao atrito da caneta, minha postura era totalmente corcunda por sempre estar debruçado sobre o papel e meus olhos passaram a ter uma aspecto turvo pelo constante esforço para focar nas letras e mesmo assim não precisava de óculos, pois só era embaçado o que se distanciava para mais de 50 cm, ou seja, os cadernos eu via perfeitamente.
Eu não tinha tempo para ler o que eu escrevia, pois ler significava não anotar, e anotar ficava cada vez mais difícil pois parecia que estava sempre correndo atrás do que acontecia. O momento e entre o acontecido e o anotado havia uma infinidade de tempo e de acontecimentos que mereciam ser memorandos para sempre. Enquanto mais escrevia mais coisas a serem escritas surgiam.
Eu possuía muitos cadernos para o registro correto das notas e justamente por conta disso eu deveria trocar entre um caderno e outro para que as informações fossem devidamente organizadas e ocorre que essa troca de material de escrita fazia com que eu perdesse uma infinidade de tempo que eu não poderia me dar o luxo de perder.
Tomei então a outra decisão derradeira da minha vida: Voltaria ao bazar que deu início a tudo, seria a visita que acabaria com todas as visitas. Compraria todas as folhas da loja, inclusive as do estoque, tudo isso para produzir um gigantesco e robusto caderno, com milhares e milhares de folhas para registrar todo e qualquer pensamento que me viesse na cabeça. Nenhuma ideia, sentimento ou palavra me escapariam agora já que não haveria perda de tempo na troca de um meio de escrita para outro.
Assim fiz.
Comprei cerca de 32 mil folhas dos mais diversos tipos de tamanho, cor, textura, material e tudo que pode variar entre um papel e outro. Essas 32 mil folhas me renderiam pelo menos 64 mil páginas, e digo pelo menos porque haveriam certamente folhas que eu deveria recortar, o que renderia o quádruplo páginas. Tive de confeccionar o caderno apenas com uma das mãos, pois com a outra eu deveria escrever detalhadamente o processo, isso fez com que a produção demorasse muitíssimo tempo, o que me rendeu muito material de escrita.
Agora nada mais escapava à tinta e ao papel. Anotava exatamente tudo que pensava e por muitas vezes o que eu não pensava. Anotava tudo que ocorrera no dia para no dia seguinte anotar tudo que anotei no dia anterior e no dia a seguir anotar tudo que anotei sobre as notas do dia em questão. Havia vezes que anotava a mesma palavra por semanas, pois após anotar certa palavra eu pensava nela e vice-versa.
Já não saía da mesa onde escrevia, já não via mais nada além do enorme caderno e já não anotava mais nada sem ser o hábito de anotar.
E com esse pensamento em mente (que não durou duas frações de segundo e por isso mesmo poderia esquecê-lo) tomei a decisão derradeira de minha vida: Andaria sempre munido de papel e caneta. Entrei no primeiro bazar que me veio à vista. Uma loja bonita, grande, repleta de prateleiras que estavam repletas de bugigangas, todas diferentes entre si. O caixa ficava ao fim da loja, de maneira que era impossível durante o percurso não reparar nos mais diversos itens da loja. Pequenos Budas, xícaras de chá, uma infinidade de modelos de relógio, de parede, de pendulo, de pilha e até mesmo um de sol. Imaginei que as canetas e pequenos blocos de papel ficavam no caixa, estava certo e os comprei.
De primeiro comecei a anotar somente as ideias que julgava de suma importância, ideias sobre filosofia, política, literatura e as poesias que lia na janela do ônibus. Depois ocorreu-me de anotar datas importantes do ano, fossem feriados, aniversários ou acontecimentos marcantes. Comecei a anotar também frases ditas por terceiros que eu considerasse bonitas e das frases bonitas passei para qualquer pensamento que demonstrava ser minimamente interessante e quando me dei por conta anotava também as piadas.
O pequenino bloco de notas logo se acabou, cabia ele na palma da minha mão, com mola na parte superior e não devia ter mais de 80 páginas. Guardei a caderneta numa caixa de sapatos que por sua vez foi guardada debaixo da cama, de maneira que se de repente durante o sono precisasse lembrar de alguma ideia podia imediatamente ir a caixa com as memórias contidas no bloco de notas (não lembro se alguma vez realizei isso).
Fui ao mesmo bazar e comprei um caderno maior e com mais folhas, tamanho A6, devia ter cento e tantas folhas, não sei precisar exatamente quantas, só sei que parecia grande o suficiente para parecer infinito já que tinham páginas o suficiente para nunca se esgotarem. Saí da loja e fui pra casa. Na metade do caminho, entretanto, me dei por conta que devido ao anotamento das datas um caderno de páginas lisas não seria o ideal, retornei então para a loja e comprei também uma agenda. Tal agenda tinha a marcação de um dia no cabeçalho e do dia seguinte na metade da folha, servindo assim como uma espécie de diário que anotava pequenos acontecimentos do dia.
Quando me dei por conta eu estava sempre com um caderno no bolso e uma caneta na orelha. Anotava nomes de livros e sinopses de filmes que via que via pelos anúncios, anotava os restaurantes que gostaria de visitar e o horário de funcionamento dos comércios e tudo mais que via pela rua.
Em um par de dias, algumas semanas e não mais que dois meses, o caderno que parecia infinito se acabou. Havia mais acontecimentos no dia do que espaço na agenda e havia pouca tinta na caneta para muita ideia na cabeça e tanto o caderno quanto a agenda-diário foram para a caixa.
Percebi que nenhum caderno na loja seria suficiente ou ideal para escrever tudo que eu gostaria, e justamente esse pensamento que me levou de volta ao bazar. Comprei folhas dos mais diversos tamanhos e gramaturas, pois agora eu produziria meus próprios cadernos, só assim iria satisfazer a demanda, já que agora não controlava somente o que anotava mas também o meio em que era anotado. Fiz cadernos pequenos de muitas páginas para anotar coisas cotidianas de maneira discreta. Fiz os mais diversos tipos de calendários, alguns para lembrar compromissos e outros que destacavam feriados e domingos e outros ainda que marcaram datas de jogos de futebol que eu deveria assistir. Havia cadernos grandes com textos que pretendia publicar mas que nunca tornei a ler por vergonha e desgosto das ideias que pareciam boas no momento da escrita.