sexta-feira, 11 de julho de 2025

 

A BRUXA DA BOM JESUS (Parte II)

Passados cinco minutos após a meia-noite, ouviu-se um rufar de asas, adentrando no velho casebre de pau a pique.
Ao acender o lampião de querosene, densas ondas de medo, vibraram como uma tunda de guanxuma nos moradores daquele cortiço e suas pupilas dilataram de terror ao vislumbrar uma gigantesca borboleta cinzenta, acavalada sobre o couro cabeludo de Joaninha.
Subitamente, todos pularam no charque, na força do ódio, contra a desengonçada borboleta de Itú, que cometeu o descalabro de invadir uma propriedade privada, logo na Bonja. Respeita a vila, caramba! Um abraço, Marcito. Tamu junto! É noix! Vamo dá-lhe!
Foco, Crisóstomo! O cara nem te conhece, seu rasgador de seda inveterado! Pare de puxar o saco dos famosos! Quem é tu na fila do pão? Cai na real, pô! Volta pra pauta. Afinal, tu é repórter ou marqueteiro?
Gente, mil perdões pela digressão, mas, já disse que a culpa é do Machado. Desde que descobri este recurso, não consigo largar a danada.
Bem, vamos parar com o nariz de cera e entregar a reportagem completa sobre a bruxa da Bom Jesus.
Sem mais, vamos aos fatos. Acabou o merchandising, meu partner, meu brabo, meu Rivotril.
Venha comigo e confira a cena. Nesse momento, João, irmão da vítima, pula com um cabo de vassoura sobre a meliante e sai errando vassouraço até que, acerta em cheio a cinzenta, que se debate, cai no assoalho encerado de vermelho e fica pererecando, em vão tentando se esquivar das demais pauladas e chutes de quatro pessoas que haviam saído da casinha e jogado a chave fora.
Quando todos pensavam ter aniquilado a nefasta criatura, em um último lampejo de motricidade bruxesca, o insólito e asqueroso animal, consegue se evadir do recinto, como um ébrio que perde o caminho de casa, após comer com farinha, aquela água que passarinho não bebe.
Agora, vamos focar na dona Amália. Opa, acho que revelei o nome da suspeita. Sim, naquele momento de justa indignação, enquanto tentava processar o que tinha acabado de acontecer bem diante da encardida chama do bom e velho lampião, a tia da vítima disse para João e Cláudia: amanhã, bem cedo, vocês vão até a casa da dona Amália com a desculpa de que querem comprar gelo e butiás e observem como ela vai reagir. Tenho quase certeza de que ela é a responsável por essa patifaria. Se for essa velha retardada, ela me paga. Vou botar ela bem no lugarzinho que ela merece.
Observe que a espada de Dâmocles pairava sobre a cabeça da anciã. Pois, mesmo possuindo grandes poderes de barganha na vila, nem que ela entrasse em uma geladeira, poderia escapar da bomba que os quatro elementos estavam prestes a lançar em sua egrégora.

 (Continua...)

Natural de Alvorada, RS, Deodato Júnior é motorista de aplicativo e palestrante. Criativo e versátil, o autor costuma criar diferentes pseudônimos para suas obras. São os casos de Salomaucriado para os livros O Lobisomem do LeprosárioProvérbios de Salomau e Teste Vocacional para Motoristas de Aplicativo e; de Crisóstomo, na obra A Bruxa da Bom Jesus: Histórias que até Zeus duvida.
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Conto publicado no livro A Bruxa da Bom Jesus: Histórias que até Zeus duvida (coletânea de contos, Editora Meia-noite, 2025).
*CLIQUE NAS PALAVRAS COLORIDAS (BIOGRAFIA).

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